A MERCENARIZAÇÃO DA ATIVIDADE NOTARIAL E DE REGISTRO A MERCENARIZAÇÃO DA ATIVIDADE NOTARIAL E DE REGISTRO
Tem-se visto na mídia algumas mensagens que vêm buscando incitar uma certa aversão à atividade notarial e de registro, popularmente conhecida como cartórios. Mas o que muitos não sabem é que por detrás desses falaciosos textos existe uma grande personagem, que avidamente, deseja apropriar-se de uma atividade estatal.
Já dizia Stuart Mill que um dos maiores riscos para a democracia são os “interesses sinistros” que desprezam o bem público. Pois bem, propõe-se aqui, desvendar os interesses sinistros que rondam a atividade notarial e de registro.
Tem-se dito que cartórios são minas de dinheiro, são burocráticos, enfim, que são desnecessários à sociedade. Pois bem, os cartórios consistem em uma atividade estatal, essencial à segurança jurídica, delegada a particulares mediante concurso público de provas e títulos, conforme previsão do art. 236 da Constituição Federal.
Esmagadora maioria dos ofícios de notas e de registros, os cartórios, são pequenos, fato esse que a mídia não aborda. Cerca de 70% das serventias são consideradas de pequeno porte, sendo que neste percentual, aproximadamente 25% são deficitárias, ou seja, operam no vermelho.
Essa é a verdadeira realidade dos cartórios, desconhecida por muitos. É a realidade do bacharel em Direito, que após anos de estudo é aprovado em um concurso público, muda-se para o interior, investe em equipamentos, zela pela eficiência na prestação dos serviços, muitas vezes trabalha sozinho, não tira férias, mas mesmo assim, se sente extremamente realizado por desempenhar um múnus público.
Essa notícia não se vê nas mídias. Ao contrário, observa-se um pequeno movimento, que procura cultivar uma imagem negativa dos cartórios. E embora o movimento seja pequeno, ele se pauta em argumentos falaciosos.
E não seria surpresa saber que quem está por detrás de toda essa “teoria da conspiração” são empresas privadas, que desesperadamente tentam tomar para si a prestação de um serviço estatal.
Na prática o que essas empresas intencionam é burlar o sistema constitucional e sorrateiramente irem se apropriando da atividade notarial e registral, através de um esquema regido pelo favorecimento pessoal, podendo assim, assumir uma atividade genuinamente estatal, sem o repasse de taxas para o governo e principalmente, alheia a qualquer tipo de fiscalização por parte do poder judiciário, como ocorre com os cartórios.
Tal pretensão trata-se de uma verdadeira mercenarização da atividade notarial e de registro, que deve ser veementemente coibida por desrespeitar a constituição e a democracia brasileira.
A atividade notarial e de registro exercida através dos cartórios é respeitada em todo o mundo, representando solidez e segurança jurídica nas negociações em que intermedeia. O sistema brasileiro em muito se assemelha à organização notarial e registral espanhola.
Em ambos os sistemas, à frente da cada ofício há um profissional, bacharel em Direito, que mediante habilitação em concurso público, exerce a atividade notarial e de registro sob sua exclusiva responsabilidade, imprimindo eficiência e uso de equipamentos de tecnologia na prestação dos serviços.
Em relação ao sistema registral espanhol, a atividade está a cargo dos “registradores de la propriedad, mercantiles y bienes muebles” , que no Brasil seria semelhante à função exercida pelos registradores de imóveis e pelos registradores de títulos e documentos e civil das pessoas jurídicas.
A atividade registral imobiliária em ambos os países possui praticamente os mesmos princípios, e no tocante ao registro de bens móveis, em muito se assemelha.
Havendo, entretanto, notória distinção na Espanha, que possui moderna legislação a respeito do registro de bens móveis, que se norteia pelo fomento da prática registral, diante dos impactos positivos que ela produz.
Conforme a lei espanhola serão objetos de registro bens móveis, tais como: barcos, aeronaves, veículos terrestres a motor, maquinarias industriais, equipamentos de empresas, garantias reais, condições gerais de contratos, bem como quaisquer outros bens com valor significativo de mercado e com caráter de identificação individualizada.
O sistema registral espanhol, da mesma forma como o brasileiro, dispõe de uma central de serviços eletrônicos, que pode ser acessada via rede mundial de computadores, de forma rápida e segura.
Sendo assim, no similar contexto brasileiro todos os direitos inerentes à propriedade mobiliária deve ser centrados no Ofício de Registro de Títulos e Documentos, “repositório natural” dos bens móveis.
Porém, mesmo diante da robustez do exemplo do sistema registral espanhol, parece que os legisladores pátrios estão indo buscar referências na Colômbia, país sem tradição na seara registral. E quais seriam as razões? Bem, seriam os “interesses sinistros”.
* Mônica Saraiva Cunha é oficial de Registro de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas e especialista em Direito Notarial e Registral
Fonte: http://www.irtdpjbrasil.com.br/